
Na quarta-feira, 02 de abril, a decisão do presidente norte-americano Donald Trump de aplicar uma tarifa geral de 10% sobre todas as exportações para os Estados Unidos, com alíquotas mais pesadas para outros países, reacendeu discussões sobre competitividade internacional e impactos nas cadeias globais de suprimentos.
O Brasil, apesar de ter sido incluído na lista de nações tarifadas, foi contemplado com a alíquota mínima — diferentemente de concorrentes diretos de espécies importantes no mercado norte-americano de pescado, como Vietnã (46%), China (34%), Tailândia (36%) e Japão (24%). E essa nova configuração comercial global pode criar cenários distintos para o pescado brasileiro.
O setor nacional, que alcançou em 2024 os melhores resultados dos últimos 15 anos, com 64,6 mil toneladas exportadas e receitas de US$ 396 milhões, viu os norte-americanos consolidarem sua posição como principal destino do pescado brasileiro, absorvendo 46,9% do volume total exportado e respondendo por 56,5% da receita gerada pelo setor.
O presidente da Associação Brasileira de Piscicultura (PeixeBR), Francisco Medeiros, lembra que os Estados Unidos são hoje o principal destino da tilápia brasileira. “Atualmente, somos o segundo maior exportador de filé de tilápia fresca para os EUA, atrás apenas da Colômbia. Como nossos concorrentes diretos também terão a taxa de 10%, não perderemos competitividade”, afirma.
Ao abordar o segmento de filé congelado — no qual a China lidera com ampla vantagem —, Medeiros destaca que a estabilidade permanecerá. “Hoje, a China é taxada em 25% e o Brasil em 0%. Com a nova taxação, a China será cobrada em 34% e o Brasil em 10%, ou seja, a diferença continua a mesma”, analisa.
Apesar disso, o dirigente faz um alerta de que a grande incógnita é como o consumidor americano reagirá a esse novo cenário. “A expectativa é que o aumento do produto para o consumidor americano possa impactar o consumo. Essa redução de consumo é o que não sabemos e que pode afetar o nosso negócio e o de outros países que também vendem tilápia para os Estados Unidos, mas somente a médio e longo prazo vamos identificar o impacto”, finaliza.
Já na leitura da indústria de pescado em geral, o cenário é mais otimista. Para o CEO da Associação Brasileira das Indústrias de Pescados (Abipesca), Jairo Gund, o tarifaço de Trump pode ser interpretado de outras maneiras para o setor brasileiro, que vem enfrentando, segundo ele, uma série de reveses no mercado interno.
“Estamos vivendo uma sequência de derrotas setoriais. Ficamos de fora da reforma tributária, abrimos a importação de conservas [de sardinha, com isenção total em cota] e, agora, vimos o retorno da tilápia do Vietnã ao mercado brasileiro [informação que circula na mídia internacional nos últimos dias]. Mas aí o Trump aparece com essa medida e, para nós, acaba sendo positiva”, avaliou Gund.
Segundo ele, a competitividade brasileira ganha fôlego: “Enquanto a China será tarifada em 34% e o Vietnã em 46%, nós ficamos com 10%. Ou seja, ganhamos 24% de competitividade sobre a China e 36% sobre o Vietnã. Logo, a leitura que fazemos é que, para a exportação brasileira, temos um incremento substancial, dada a competitividade em relação aos países asiáticos”, diz.
Mas o otimismo vem acompanhado de cautela, já que Gund projeta efeitos indiretos no mercado interno, em especial sobre os preços. “Haverá uma pressão de baixa nos preços dos produtos asiáticos, com maior oferta interna. Produtos como o panga e outros oriundos da Ásia deverão ter queda nos preços por conta do desestímulo ao mercado americano. Isso deverá favorecer as importações desses produtos aqui no Brasil.”
Além disso, para ele, há a preocupação de que a tilápia importada também venha com uma oferta bem agressiva, prejudicando o mercado nacional. “Porém, a estrutura de produção do Vietnã ainda não está montada para a tilápia”, observa. “Precisamos monitorar se a matriz de produção do Vietnã migrará do panga para a tilápia e, se isso acontecer, deveremos ter um impacto negativo no mercado interno”, completa.
Assim, para Gund, a decisão norte-americana pode ser um divisor de águas. “Vamos ter um impulsionamento cada vez maior no mercado norte-americano, que já vem reconhecendo o produto brasileiro pela qualidade superior, mas agora teremos competitividade em relação ao produto asiático”, finaliza.
Júlio César Antônio, presidente da Associação Brasileira de Fomento ao Pescado (ABRAPES), reforça que as tarifas têm um impacto significativo no mercado global de pescado, destacando pontos importantes. "O Brasil, por exemplo, agora enfrenta uma tarifa de 10% nas exportações para os Estados Unidos, o que já é um fator a ser considerado. Porém, o cenário fica mais evidente quando olhamos para outros players. O Chile, que antes era isento de impostos para o salmão exportado aos EUA, agora também está sujeito a uma tarifa de 10%", diz.
Em comparação, ele analisa que a Noruega foi taxada em 15%. "O que, em tese, dá ao Chile uma vantagem competitiva sobre os noruegueses nesse mercado", fala.
No entanto, para Antônio, há uma preocupação crescente. "Não sabemos ao certo como o consumidor americano vai reagir a um possível aumento de preços do salmão chileno por conta dessa tarifa. Caso a absorção nos EUA diminua, o Chile pode redirecionar seu foco para o Brasil inundando nosso mercado com oferta. Isso já está começando a acontecer, e o resultado é uma pressão nos preços, que estão em queda. Como diz o ditado, ‘de onde sai o couro, sai a correia’ — o desafio agora é entender como equilibrar essa dinâmica para proteger o mercado interno e os produtores locais", completa.
Fonte: seafoodbrasil.com.br
Postado em 11-04-2025 à22 10:23:22