Estado líder no cultivo de tilápias pode ter produção estrangulada

Primeiro colocado no ranking nacional em cardumes de tilápias, o Paraná mira na ampliação de unidades produtoras. Mas a principal dificuldade apontada pelos produtores é burocrática: a emissão das outorgas. As filas para acesso ao ato administrativo, que determina condições definidas pelo poder público na permissão para uso de recursos hídricos por um prazo determinado, têm aumentado.

Na contabilidade total, existem 6.230 outorgas de uso de água em vigência e 655 solicitações na fila de espera no estado, de acordo com o Instituto Água e Terra (IAT). Como resultado da demora, uma parcela dos produtores tem abandonado o segmento. Cerca de 30% dos piscicultores desenvolve a atividade apenas com protocolo da outorga emitido no licenciamento ambiental, sem a emissão efetiva, que é uma obrigatoriedade para o setor. O problema é evidenciado na região oeste do estado, que concentra 80% da produção paranaense do peixe.

Das cerca de 361.286 toneladas produzidas nacionalmente, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Paraná é responsável por 38,5% do cultivo da tilápia.

Oito a cada dez piscicultores, na avaliação do Instituto de Desenvolvimento do Paraná (IDR), é independente e precisa, além de lidar com a burocracia, arcar com o custo de produção e encontrar compradores. A fila de produtores que querem ampliar a produção, mas aguardam por outorgas, gira em torno de 600, de acordo com o diretor do IAT de Toledo, Taciano Maranhão. “Não fossem esses problemas, poderíamos triplicar a produção”, calcula.

Como opção viável de diversificação no meio rural, principalmente para pequenas e médias propriedades, a piscicultura precisa, com certa urgência, desta atenção na legislação ambiental, reconhece o diretor do IAT. Por mais que o território paranaense esteja em cima do maior depósito de água doce do mundo, o Aquífero Guarani (que se estende por Uruguai, Argentina e Paraguai), a avaliação é não tem água para tantos piscicultores.

“A vazão outorgada [liberada para captação] é de 20% da totalidade e quem define esse percentual é o comitê de bacia [na região oeste é a Bacia do Paraná 3, BP3]. Participam desse comitê representantes do poder público, iniciativa privada, indústria, associações produtoras, e é ele quem pode optar pelo aumento, de 20% para 50% da vazão, por exemplo. Se fizer isso, vai ter sobra de água para os piscicultores terem mais acesso à atividade, mas não há previsão de isso acontecer”, responde Maranhão, ponderando sobre a necessidade de mudança na legislação. “Se uma indústria tiver água de um poço que faz uso, isso se soma como se estivesse captando”, acrescenta.

A alternativa, na avaliação de Maranhão, é a rediscussão do percentual de 20%, pelo Comitê de Bacias, para a piscicultura. “Muitos deles captam a água dos rios e ela é lançada de volta, diferente de uma irrigação que capta água, joga no solo e evapora. Quem precisa pressionar são os usuários [cadeia produtiva] com o comitê de bacias para que essa solução venha. Se isso ocorrer, 60% dos problemas [da piscicultura comercial no Paraná] seriam resolvidos”, destaca o diretor do IAT em Toledo, que também é vice-presidente do comitê de bacias da BP3 e respondeu que vai instigar o grupo para um encontro específico para tratar do tema. “Uma das alternativas é a possibilidade de fazer reuso de água. Ter um sistema de tratamento que pode aumentar a demanda e flexibilizar [a captação]”, considera ele.

Taciano Maranhão desenvolve um estudo técnico da piscicultura comercial do Paraná e está pesquisando o reuso de água. “Meu doutorado será em sistema de tratamento de afluente de piscicultura para que haja possibilidade de incremento da água utilizada em mais de 40%. O reuso da piscicultura é muito diferente do sistema industrial, que usa componentes químicos, por exemplo. Na piscicultura, é basicamente matéria orgânica e algas, ou seja, um pré-filtro a faria retornar para o ambiente adequadamente”, explica.

Cooperativas em destaque

A transformação no maior produtor brasileiro de tilápias está diretamente relacionada com o investimento e profissionalização das cooperativas paranaenses. Em 2017, a C.vale, com sede em Palotina, no oeste do Paraná, investiu na construção de um abatedouro exclusivo de peixes. Reconhecida no mercado avícola, a nova mira foi certeira. O volume inicial de abate foi de 75 mil tilápias por dia, mas a planta tem capacidade de abate diário de 150 mil tilápias. “A indústria tem 10 mil metros quadrados e utiliza tecnologias alemã, islandesa e brasileira para o processamento de peixes”, informa a cooperativa, que atende mercados internos e externos.

A pioneira no segmento peixe no Paraná foi a Copacol, com sede em Cafelândia, e detentora de 13% do abate estadual. São 286 cooperados no sistema de integração que fornecem peixes à unidade industrial com maior capacidade de abate de tilápias da América do Sul. Por lá, o processamento diário é de 185 mil peixes, em duas unidades nos municípios de Nova Aurora e Toledo. Na mesma região, a mais recente a focar no segmento foi a Frimesa. Reconhecida pela carne suína e derivados, a indústria também viu na piscicultura um segmento significativo.

No norte do Paraná, outras duas cooperativas também investem no setor: a Cocari em Alvorada do Sul, e a Coopermota, em Cornélio Procópio. “Quem está integrado, ligado às indústrias, são os melhores piscicultores. Eles possuem as melhores condições de produção e as cooperativas buscam esse produtor que tem aptidão técnica e estrutura. Quem não está qualificado e com produção de excelência costuma seguir de forma independente, pagando pelos custos de produção e vendendo para quem encontrar no mercado”, avalia Miguel Antonucci, coordenador estadual da piscicultura do Instituto de Desenvolvimento Rural (IDR), que presta orientação técnica aos produtores. O foco está nos independentes, uma vez que cooperados recebem acompanhamento técnico das próprias cooperativas.

“Outro ponto que afeta a piscicultura é que o independente tem risco, banca o custo de produção (que é caro), não tem mercado definido, pode vender e não receber. Então a maneira possível, apesar da margem de lucro menor, é a integração”, segue Taciano Maranhão.

Cautela e ação para aumentar a produção de tilápias

Para o analista de desenvolvimento técnico e mercado do Sistema Ocepar (Organização das Cooperativas do Estado do Paraná), Alexandre Amorim Monteiro, sanar esses problemas é imprescindível para manter o que já existe – evitando estrangulamentos – e aumentar a produção.

Com análise de mercado e uma demanda crescente gradativa, as cooperativas devem elevar o número de integrados. Juntas, Copacol, C.Vale, e Cocari têm cerca de 400 integrados. “Problemas com as outorgas podem ameaçar a produção que temos hoje. Independentes e integrados estão sofrendo com este mesmo problema, que precisa ser discutido o quanto antes. Entendemos que os comitês de bacias possuem participantes de todos os segmentos e pode gerar diversas discussões. É um debate longo, mas estamos debatendo com as autoridades para que o segmento não seja prejudicado”, reforça Monteiro.

Atualmente, as cooperativas processam no Paraná 42% da produção estadual de tilápia, o que representa pouco mais de 65 mil toneladas ao ano. "O consumo interno vem crescendo, mas ainda é baixo. O principal mercado é o externo”, observa o analista.

Ciclos da tilápia

A tilápia, que não é uma espécie nativa do Brasil, se adaptou bem ao clima e temperatura do país. Vinda da África e Oriente Médio, é uma opção de diversificação à propriedade porque, entre os peixes comerciais, possui um dos menores ciclos de desenvolvimento: varia de quatro a seis meses.

O primeiro é a produção de alevinos, com produtos qualificados e que não costuma enfrentar problemas. Os outros dois segmentos são o juvenil, durante o qual os produtores recebem os alevinos e os alimentam, e a engorda, última fase antes do abate. E é onde os problemas se concentram. “Mesmo com os problemas que enfrentamos, somos referência nacional na produção. Quatro a cada dez tilápias produzidas no Brasil são paranaenses e podemos ampliar ainda mais”, calcula Maranhão.

Bactéria ameaça a produção de tilápias?

A bactéria Klebsiella pneumoniae também começou a preocupar o segmento. A tranquilização aos produtores de tilápia vem da Associação Brasileira da Piscicultura (PeixeBR), que afirma que a bactéria não oferece risco para a tilápia produzida no Brasil.

“A entidade consultou diversos especialistas e enfatiza que a referida bactéria, comum na microbiota intestinal de diversas espécies animais – inclusive seres humanos –, não é um patógeno da tilápia e, assim, não representa risco para a atividade e os consumidores brasileiros”, esclarece o órgão.

Ainda segundo a Peixe BR, as práticas de biosseguridade, utilizadas na piscicultura brasileira possibilitam identificar eventuais patógenos prematuramente, agindo proativamente para evitar sua proliferação. A instituição afirma que as indústrias de produtos para saúde animal associadas fazem "um excelente e minucioso trabalho de vigilância sanitária de patógenos nos projetos de produção de peixes de cultivo de todas as regiões brasileiras e nunca identificaram a K. Pneumoniae”.

Fonte: gazetadopovo.com.br/ Foto: Jonathan Campos/AEN


Postado em 23-02-2023 à30 20:33:30

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